segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Ainda a discussão com o colega ateu

O colega ateu, com quem venho discutindo há alguns dias, ficou surpreso com a minha colocação de que o que mais prejudica o mundo hoje é a credulidade, não o ateísmo. E me perguntou: Será que você agora é laico? ou seu deus também é peculiar? Eis a minha resposta:

caro amigo,

Minha resposta será um pouco longa, mas você merece a minha atenção detida.

Sempre fui laico, ou melhor, leigo, de laos, laikós, vale dizer, homem indistinto da massa do povo. Sempre fui, e continuo sendo, pela manutenção e ampliação da saudável laicidade nos assuntos estatais.

Lamento, no entanto, a enorme confusão terminológica que existe no particular, especialmente entre laicidade e laicismo; explico que entendo este último como a exclusão, a priori, da legitimidade dos argumentos de ordem religiosa nas discussões do interesse público. Isso, creio, é intolerância.

É saudável e democrático que as discussões, na esfera pública, admitam os argumentos teístas, deístas, agnósticos e ateístas, uma vez que o povo está composto por pessoas que professam todas estas posições.

Defender, portanto, em nome de um "laicismo" mal compreendido, que os teístas e os deístas não têm o direito de participar das discussões públicas como são, ou seja, como teístas e deístas, não é defender a laicidade estatal, mas restringir a própria democracia, o que não está de acordo com o nosso sistema constitucional.

Sobre isto, há um excelente artigo, que reflete um debate de Christopher Tollefsen sobre as posições de John Rawls e de Habermas (este último me surpreendeu...), exatamente sobre a discussão de interesses públicos e a legitimidade da participação dos cidadãos que professam princípios religiosos. Foi um excelente professor quem me passou este artigo, talvez o melhor professor de direito constitucional do país, hoje. Sei que você lê bem em inglês, se quiser eu disponho desse artigo para te emprestar.

Quanto à laicidade, assim entendida como a desvinculação recíproca entre a autoridade política e a autoridade religiosa, não vejo como poderia ser de outra forma. A César o que é de César. A Deus o que é de Deus.

E, por fim, quanto ao que creio, começo por uma ressalva: dizer "creio em Deus" é não dizer nada, como a recente campanha publicitária da tua associação ATEA mostrou (no cartaz que aponta Hitler como um pretenso "Crente em Deus" e Charles Chaplin como ateu). Acertaram na mosca.

Só erraram na conclusão do raciocínio: não se pode, desse cartaz, concluir: "não creia em Deus", senão apenas "não creia no deus de Hitler, antes prefira o exemplo de Chaplin, no modo como conduziu a sua vida". Não vejo como nenhum cidadão de bem poderia discordar disso, crente ou não, se fosse colocado assim.

Mas isso não é novidade, a Bíblia já fazia uma consideração semelhante: até os demônios crêem em Deus, diz a Bíblia. E estremecem (Tg 2, 19).

Por isso, não se trata de "crer em Deus", pois o diabo, a seu modo, crê com muito mais certeza do que eu. Mas não se ajoelha.

Trata-se, portanto, de viver, de conduzir sua própria vida, no inefável amor da Trindade Santa, como revelada historicamente por Jesus Cristo. Em suma, as melhores palavras para expressar o conteúdo da minha fé (fides quae) estão no credo apostólico, como preservado e ensinado pela Igreja, e o que ela significa para a minha vida (fides qua) está em ser absolutamente viciado no amor de Jesus Cristo, que me foi dado, por graça, experimentar.

Espero ter respondido.

Abraços.

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